Em dezembro de 2019, foi identificado o primeiro caso da doença causada pelo vírus SARS-CoV-2, na cidade de Wuhan, no sudeste da China. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), daquele momento até o dia 31 de janeiro de 2023, foram contabilizados mais de 750 milhões de casos de Covid-19 em todo o mundo, com mais de 6,8 milhões de mortes. 

Até essa mesma data, mais de 13 bilhões de doses de vacinas foram aplicadas, o que ajudou a conter o avanço da Covid-19 no mundo, mas as terríveis consequências da enorme crise econômica, sanitária e social causada pela pandemia ainda serão sentidas por muito tempo. Para os sistemas nacionais de saúde, a pandemia, que trouxe dificuldades até então inimagináveis, também deixou grandes cicatrizes e muitos desafios que precisam ser superados o quanto antes. A descontinuidade de programas e intervenções comunitárias e a interrupção da prestação de serviços essenciais de saúde, ocorrida em quase todos os países, causaram fortes impactos nos programas ambulatoriais, nos atendimentos de emergência e nas cirurgias eletivas, e, por conta de inúmeras demandas represadas, acrescentaram novas preocupações às já existentes.

Também foram grandes as perdas e repercussões decorrentes da Covid-19 na força de trabalho em saúde: a morte de um grande contingente de trabalhadores e as alterações significativas de sua rotina pessoal e laboral causaram a exaustão e o sofrimento psíquico dos profissionais. O aumento expressivo da demanda foi acompanhado de dificuldades na reposição da força de trabalho devido aos efeitos da pandemia sobre a formação dos trabalhadores da saúde. A superação desses desafios e a retomada dos compromissos expressos na Agenda 2030, cujo alcance foi severamente afetado pela pandemia, implicam em grandes responsabilidades para as instituições, tendo em vista a importância de coordenação de respostas eficazes aos problemas e necessidades das populações.

OS CICLOS DE OFICINAS SOBRE A FORMAÇÃO E O TRABALHO DOS TÉCNICOS EM SAÚDE

Em outubro de 2020, já diante das dificuldades impostas pela pandemia às instituições formadoras de forma geral, foi realizado o 9º Seminário Virtual da Rede Internacional de Educação de Técnicos em Saúde (RETS), com o tema ‘A Covid-19 e a formação dos técnicos em saúde’. Naquele momento, as preocupações manifestadas pelas instituições presentes apontaram a necessidade de ampliar as discussões sobre os problemas que estavam enfrentando e sobre possíveis estratégias que permitissem a continuidade de seu trabalho.

Era mais um esforço para minimizar os efeitos nefastos da pandemia sobre a formação de técnicos em saúde qualificados e aptos a assumirem o quanto antes suas funções nos serviços de saúde. Diante desse cenário, a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz (EPSJV/Fiocruz), Centro Colaborador da Opas/OMS para a Educação de Técnicos em Saúde desde 2004, propôs à RETS e suas sub-redes – a Rede Ibero-Americana de Educação de Técnicos em Saúde (RIETS) e a Rede de Escolas Técnicas de Saúde da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (RETS-CPLP) – a realização de um ciclo de oficinas virtuais. A iniciativa, desde sua concepção, contou com o apoio do Programa Sub-regional para América do Sul da Organização Pan-Americana da Saúde/Organização Mundial da Saúde.

O ciclo de oficinas ‘Desafios da formação de técnicos em saúde no contexto da pandemia’, realizado em 2021, resultou na publicação de um e-book com as sínteses e recomendações das oficinas realizadas, de forma a incentivar a continuidade das discussões e as reflexões acerca dos temas apresentados. O sucesso da iniciativa incentivou a realização de um novo ciclo de oficinas em 2022 sobre a ‘A formação e o trabalho de técnicos em saúde no mundo pós-Covid’ e a elaboração de uma nova publicação. 

A PUBLICAÇÃO ATUAL

Para nós é muito gratificante apresentar este e-book, fruto de um trabalho coletivo realizado, inicialmente, em meio a muitas dores vividas por todos nós durante a pandemia. O projeto desenvolvido pela EPSJV/Fiocruz e pelas instituições que integram as redes internacionais de formação de técnicos em saúde – RETS, RIETS e RETS-CPLP –, com participação ativa de organizações multilaterais, permitiu o desenvolvimento de atividades, guias e publicações como esta. A expectativa é que nossos leitores possam se apropriar dos temas selecionados e das discussões realizadas para encontrar pistas que os ajudem a dar respostas às dificuldades enfrentadas em seus contextos locais.

O ciclo de oficinas é um chamado para reafirmar a saúde como direito humano básico e os técnicos como atores e atrizes-chave no planejamento de recursos humanos na saúde. É um apelo para a compreensão do papel relevante que os docentes assumem nos processos formativos de qualidade seja nas escolas, seja nos serviços, não apenas com relação ao conteúdo técnico transmitido, mas das questões relacionadas ao trabalho desses técnicos em equipe multidisciplinares e à sua participação nos processos de gestão dos serviços em que estão inseridos.

Esta publicação foi elaborada por uma equipe multidisciplinar preocupada não só com a qualidade do conteúdo, mas também com sua apresentação. Nossa intenção é que o uso de uma linguagem mais acessível e de indicações de documentos complementares ao texto, entre outros recursos, torne a leitura mais leve, porém não menos densa. Assim como a publicação anterior, este livro digital reúne, de forma sistematizada,
a memória das discussões desenvolvidas ao longo das oficinas realizadas em 2022, a partir de experiências apresentadas pelos membros das redes, e está dividido em três partes:

• A parte 1 engloba a apresentação da publicação e dois textos introdutórios. Um deles caracteriza aquilo que estamos chamando de contexto pós-pandêmico na área da saúde. O segundo trata das redes como comunidades epistêmicas e procura mostrar a importância das mesmas na geração de conhecimentos sobre temas específicos. 

• A parte 2 traz uma síntese de cada uma das quatro oficinas – ‘APS, a agenda 2030 e a formação e trabalho dos técnicos em saúde’, ‘Interculturalidade e a formação de técnicos em Saúde’, ‘Saúde mental e a formação de técnicos em saúde’ e ‘Informação e registros em saúde: o papel dos técnicos’ – e destaca seus principais aspectos.

• Na parte 3 estão reunidas as considerações finais e as principais recomendações das oficinas sobre os temas discutidos. 

Este e-book é um contraponto à crescente proliferação contemporânea de informações falsas ou de origem duvidosa e à negação da ciência. Ele pretende ser uma ferramenta útil ao fortalecimento do trabalho em rede, da formação de técnicos em saúde e da divulgação técnico-científica de qualidade. Esta publicação é mais um recurso disponível para auxiliar na construção e consolidação de sistemas nacionais de saúde que possam, de fato, atender as necessidades de saúde das populações. Nesse sentido, esperamos que todos aqueles que se interessam por questões relacionadas à formação de trabalhadores para a Saúde possam construir conhecimentos a partir das informações apresentadas e queiram compartilhar esta publicação com outros que também venham se beneficiar de seu conteúdo.