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Publicado em: 23/08/2018

Seminário Virtual da RETS discute determinação social das arboviroses

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‘A determinação social das arboviroses: vigilância em saúde e ações territorializadas’ foi o tema do 4º Seminário Virtual da RETS, realizado em conjunto com a Rede de Institutos Nacionais de Saúde da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (RINSP), no dia 12 de julho. Alexandre Pessoa, professor-pesquisador da Escola Politécnica de Saúde Joaqui Venâncio (EPSJV/Fiocruz); Rivaldo Venâncio, professor titular da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS); e Gabriel Schütz, professor adjunto da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), apresentaram os desafios do enfrentamento das arboviroses (Zika, Dengue, Febre Amarela, dentre outras) em nível global, bem como a necessidade da análise crítica das políticas públicas de saúde.

Segundo Rivaldo, existem aproximadamente 550 espécies de arbovírus no mundo, dentre as quais, mais de 150 relacionadas a doenças em seres humanos. No Brasil, há mais de 200 espécies, 40 delas causando doenças em humanos. Mas por que surgem arbovírus? Rivaldo explicou: “Temos uma adaptação do processo evolutivo de diversas espécies de vírus. Esse processo de evolução e adaptação pode estar selecionando linhagens desses vírus que são mais resistentes a influências ambientais ou à ação externa do homem. Outra questão são as mudanças ambientais que o homem tem provocado e que têm influência marcante sobre os novos vetores e ciclos de manutenção”.

Ele explicou que os arbovírus que causam doenças em humanos pertencem a diversas famílias. A partir de 2016, o Brasil assistiu a uma reemergência da Febre Amarela silvestre, inicialmente, no estado de Minas Gerais e depois na região Sudeste como um todo. “Hoje, no período de um ano, temos mais casos do que tivemos nos últimos 50 anos. De repente, passamos a ter 1.500 casos confirmados e mais dois mil em processo de confirmação”, destacou.

Rivaldo chamou atenção ainda para possíveis surtos futuros do vírus Nilo Ocidental, que também faz parte da mesma família do da Febre Amarela e já está circulando no Brasil. Segundo ele, é preciso ficar atento. “O Nilo conta com uma gama muito grande de potenciais transmissores – ao menos 25 espécies de Aedes, sete de Anopheles e 12 de Culex, além de poder ser transmitido também por transfusão de sangue e pela amamentação”, alertou Rivaldo, que acrescentou que o vírus tem um alto potencial de causar encefalites – infecções agudas do cérebro.

Para o professor Gabriel Schütz, há diversas ações de controle epidemiológico que são e devem ser implantadas. Com relação ao agente, o professor exemplificou ações importantes como identificação de sorotipos, monitoramento de variações genéticas e vigilância do aparecimento de resistências. “As estratégias de controle dos focos vetoriais perecem ser mais eficazes, porém devem vencer a difícil barreira do individualismo. Já as ações químicas sobre o vetor não dão certo porque buscam a extinção de uma espécie sem levar em consideração a sua capacidade de adaptação às novas condições”, afirmou. Em relação ao hospedeiro, Gabriel citou o uso de vacinas e repelentes. “As estratégias químicas individuais, como os repelentes, e as coletivas, como os inseticidas ambientais, são lucrativas. Porém, essas ações são pouco eficazes e podem implicar riscos tóxicos. O desenvolvimento de vacinas não parece estar na agenda nem do mercado nem do Estado. Por que o mercado gostaria de fazer vacinas contra doenças transmitidas por mosquitos enquanto a curva de crescimento da venda de repelentes está crescendo tanto?”, questionou.

Alexandre Pessoa destacou que a vigilância em saúde é e deve ser, uma política de Estado, porque requer um conhecimento tecnológico e uma ação sistemática sobre os determinantes e sobre os processos de doenças e agravos e que isso exige recursos significativos.  Para o professor, o enfrentamento das arboviroses já exige a compreensão de que são doenças emergentes e isso traz um desafio da continuidade de investimentos do campo da Vigilância em Saúde. “Diante dos surtos, você tem uma maior mobilização do poder público, mas quando os casos diminuem, a descontinuidade dificulta que a vigilância, de fato, possa promover ações estruturais e estruturantes no território. É preciso ter a compreensão de que a determinação social e o manejo das águas e do solo interferem sobre um conjunto de doenças”, alertou Alexandre, que citou como outro desafio a questão da integração entre as vigilâncias  que, segundo ele, a EPSJV/Fiocruz, em especial, já debate há mais de 20 anos.

De acordo com Alexandre, o contexto de ampliação das arboviroses aumenta a necessidade da formação técnica em Vigilância em Saúde, com o processo de trabalho pautado na territorialização e na promoção da saúde. “Entendemos que os processos formativos são estratégicos porque estamos falando de um exército de trabalhadores que desempenham as suas atividades em uma relação multiprofissional  com as populações e que é fundamental que os seus processos formativos aumentem diante da complexidade dos problemas de saúde. A Escola Politécnica, que tem uma experiência de formação de currículo tanto para Agentes Comunitários de Saúde como de Vigilância em Saúde, aponta a necessidade de processos de captação e itinerário formativo para que haja Técnicos de Vigilância em Saúde”, resumiu, questionando em seguida como esse processo de controle de arboviroses terá efetividade num momento em que o Ministério da Saúde decidiu financiar cursos técnicos de enfermagem para os trabalhadores da vigilância. Alexandre se referia ao Programa de Formação de Profissionais de Nível Médio para a Saúde (Profaps), lançado em 2010, na contramão das políticas de educação profissional que defendiam a formação técnica específica na sua área para ACEs e agentes comunitários de saúde.

Fotos/Ilustrações: 

CCDE/EPSJV